Os factores de ordem económica

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  • Deve ter-se cuidado para não confundir económico - no sentido próprio do termo com financeiro: podem interferir, mas permanecem distantes por natureza.
  • As causas financeiras da revolução têm a ver com o défice orçamental, que desempenhou seguramente um papel nos acontecimentos, pois está na origem da convocação dos estados gerais. O estudo das instituições do antigo regime deu-nos a conhecer a situação cronicamente deficitária das finanças devida à ausência de administração financeira, a que se juntava a impotência da monarquia para suprimir os privilégios.
  • Causas financeiras (não económicas): A situação é agravada pela guerra de independência da América, que obriga a despesas consideráveis e implica o recurso ao empréstimo. Eis um tipo de causas semiestruturais e semiconjunturais, pois as consequências financeiras da guerra são indissociáveis da conjuntura e o estado crónico das finanças das estruturas.
  • Por outro lado, as causas económicas são mais importantes e mais duradouras e dizem respeito ao próprio regime da economia francesa, isto é, ao modo de organização da riqueza e da distribuição dos bens.
  • Algumas dessas causas têm a ver com a conjuntura e este elemento não pode ser negligenciado. Em 1789, a economia francesa encontra-se numa situação difícil. A causa é muitas vezes atribuída ao tratado de livre-câmbio.
  • Nos anos de 1780, a Europa tenta uma espécie de liberalização das relações económicas, uma, primeira experiência, ainda tímida, de livre-câmbio. Diversos tratados de comércio e de navegação são então assinados. Estes tratados têm em comum o facto de alargarem as trocas e de reduzirem as barreiras alfandegárias, abrindo assim uma brecha no sistema mercantilista que regulava estritamente as relações entre as economias nacionais. Este tratado, tem um mau acolhimento na imprensa em França, onde os industriais e comerciantes lhe atribuem a responsabilidade do seu marasmo.
  • De cada vez que se reduzem as barreiras alfandegárias, comerciantes e industriais insurgem-se.
  • Mais determinantes foram certamente os factos estruturais, os que dizem respeito à organização da economia francesa. Esta economia é caracterizada pelos entraves que pesam sobre ela, uns técnicos e os outros jurídicos. A ameaça crónica da penúria (escassez) faz da fome o primeiro problema dos indivíduos e dos governos; a França vive na fobia da escassez, na recordação das fomes precedentes e na apreensão do seu possível retorno.
  • As penúrias alimentares são tanto mais de temer quanto mais a população cresce rapidamente, mais depressa do que a produção dos cereais.
  • Esta situação inscreve-se num movimento de longa duração. Na história económica fala-se das variações dos preços e dos movimentos de curto e de longo prazo. Aproximadamente desde o fim do reinado de Luís XIV, a tendência é ascendente e a economia da Europa conhece um movimento de subida lenta de preços que provoca um a série de consequências que actualmente conhecemos bem.
  • A alta dos preços é no conjunto favorável à expansão da produção e o século XVIII é para alguns um século de prosperidade. Esta alta provoca o encarecimento dos bens alimentares; para quem se encontra na posição de
    consumidor, isso significa um aumento das despesas e uma diminuição do poder de compra.
  • A conjunção da penúria intermitente e do contínuo aumento
    dos preços explica o descontentamento e o nascimento de um espírito pré-revolucionário nessa porção da população das cidades que depende da produção agrícola para a sua subsistência. O mesmo fenómeno enriquece os outros grupos que produzem e vendem. Apercebemo-nos através do caráter ambivalente da maior parte dos factos, nomeadamente económicos, que é uma das constantes da realidade social. Deste modo, o mesmo fenómeno faz pessoas felizes e infelizes, sendo impossível dizer se é em si mesmo benéfico ou nefasto.
  • É ainda necessário dizer algo sobre o sistema das corporações que participa na organização jurídica e institucional da sociedade e que acresce às suas limitações. Na verdade, em numerosos ramos de atividade, o trabalho não é livre, mas regulamentado, e só se pode exercê-lo na condição de se pertencer a uma corporação. Assim, as quantidades, as formas, as condições, da produção encontram-se fixadas e todas as infrações são sancionadas com uma multa, por
    vezes mesmo com a anulação da autorização de produzir ou de vender.
  • O conjunto dessas limitações, que dantes se justificava por necessidades sociais, políticas, frequentemente financeiras, perdeu nos finais do antigo regime a sua justificação. O progresso técnico, a multiplicação das invenções, a acumulação dos capitais, o nascimento de novas formas de indústria, a formação de uma classe de negociantes, concorrem para tornar caduca esta organização. É no plano da atividade económica que se verifica o mesmo contraste que, do ponto de vista da organização social, existe entre quadros seculares que parecem anacrónicos e forças novas que os tentam abolir.
  • É indubitável que o desejo de inovação e a necessidade de iniciativa colocaram muitos produtos no campo das forças revolucionárias em 1789.