Após o movimento liberal, que desencadeou a evolução política e social da Europa e definiu uma forma de regime e um tipo de sociedade, e após a ideia democrática, cujas ramificações e aplicações passámos em revista, vamos abordar a fase que se reclama do socialismo.
A era liberal corresponde, grosso modo, à primeira metade do século XIX. A belle époque da democracia principia cerca de 1848 e estende-se pelo menos até aos primeiros tempos que se sucedem ao fim da Primeira Guerra Mundial. O avanço socialista situa-se ainda mais tarde, manifestando-se somente no último quartel do século.
Dos três movimentos sucessivos, é certamente o último que mais requer o confronto permanente entre história política e história social, visto que, para o movimento operário e o socialismo, o político e o social interpenetram-se estreitamente. As próprias denominações sublinham a osmose entre o político e o social: utiliza-se correntemente a expressão movimento operário, que acentua a referência sociológica, e o termo socialismo, que designa uma inspiração filosófica, estando os dois estreitamente imbricados.
Enquanto se podia estudar o liberalismo e a democracia de dois pontos de vista diferentes, o das ideias e o das bases sociais, da clientela, veiculando os dois pontos de vista representações distintas e complementares sobre a realidade considerada, quando se trata do socialismo, a abordagem sociológica impõe-se imperiosamente.
O primeiro dado é, com efeito, o encontro que se verificou, no século XIX, entre duas realidades de natureza diferente: entre o socialismo, por um lado, doutrina da vida política e social, que cria escolas, organizações, partidos, tendo em vista umaação de transformação política que releva da chamada história política, e, por outro lado, um fenómeno que diz repeito essencialmente à história da sociedade, a formação de uma categoria social, a classe operária, que se organiza num movimento para a defesa dos seus interesses, a satisfação das suas reivindicações profissionais.
É a conjunção destas duas realidades que justifica a singularidade e importância deste capítulo da história geral.
As origens do socialismo são bem anteriores à revolução industrial. A intuição primeira, a inspiração inicial, do socialismo não deve mesmo nada ao proletariado, no sentido moderno de termo, visto que começou por ser elaborada em torno dos problemas agrários em sociedades rurais. A reivindicação da igualdade e a fórmula da partilha foram aplicadas, em primeiro lugar, à propriedade da terra.
Não é só a sua pré-história que revela que o socialismo pode ser diferente de um industrialismo, mas também o seu presente mais contemporâneo. Nos países subdesenvolvidos, onde a agricultura é predominante, como na América Latina. O socialismo africano refere-se às tradições ancestrais da África negra e a maior parte dos regimes propõem-se conciliar o socialismo moderno com o passado tradicional das aldeias africanas. A originalidade do comunismo chinês é que a China atribui maior importância à questão agrária do que o socialismo soviético.
Assim, tanto o passado como o presente mostram que o socialismo não se reduz à filosofia das sociedades industriais, que pode haver — já houve — um socialismo das sociedades rurais.
Reciprocamente, o movimento operário poderia ter bebido a sua inspiração noutras doutrinas. De resto, no fim do século XVIII, as primeiras reações de defesa operária em Inglaterra não se reclamam de um pensamento socialista. Voltadas para o passado, procuram o restabelecimento da regulamentação dos séculos XVI e XVII, a reposição do estatuto dos artífices, que é uma carta corporativa. Em França, a elite operária dos companheiros olha também para o passado, que, com o recuo do tempo, lhe parece uma idade de ouro, em reação contra o individualismo liberal e a concorrência saída da revolução.
Houve um carácter fortuito do encontro que se verificou, no século XIX, entre o movimento operário e o socialismo. Mas o importante é que o encontro se deu.
O socialismo absorveu pouco a pouco as preocupações da classe operária, fez suas as reivindicações dela, para as quais procurou solução, e é sobretudo nela que se apoia. É no proletariado dos operários da indústria que as escolas e os partidos que se reclamam do socialismo recrutam os seus quadros e os seus militantes. Em compensação, o movimento operário deve ao socialismo o essencial da sua inspiração, a força da sua ação, a sua visão do mundo. Vai ainda receber do socialismo a sua estratégia, o seu método, o seu vocabulário e os seus temas motores.
Para discernir a história deste encontro entre o socialismo e o movimento operário é necessário ir às origens, isto é, à formação de uma nova categoria social saída da revolução industrial.