Antes de descrever o processo pelo qual a Europa se precipitou num novo conflito, ao sair de uma paz precária e instável, é necessário regressar um ponto atrás e examinar uma por uma as componentes da crise que culminará com a entrada em guerra, em 1939.
A crise das democracias encontra a sua razão de ser na conjunção dos ataques que lhe são dirigidos do exterior pelo fascismo e pelo comunismo e das imperfeições de ordem interna. É precisamente esta conjunção que provoca a sua gravidade. Se a democracia tivesse conhecido apenas dificuldades internas, a opinião pública teria tomado o seu partido e a democracia teria triunfado. O mesmo se teria passado se só tivesse de repelir ataques externos, sem encontrar conivências no seu interior.
Mas há concomitância nos sinais de fraqueza e nos ataques que lhe movem inimigos irredutíveis que atingem os seus próprios fundamentos. O comunismo e o fascismo afiguram-se mais dinâmicos, mais modernos, mais bem adaptados, valem-se de uma eficácia considerada superior, colhem argumentos nas deficiências internas da democracia e pretendem, perante o formalismo da democracia burguesa, instaurar uma ordem mais justa e mais igualitária. Deixemos por ora as críticas dos adversários para nos debruçarmos sobre as imperfeições internas.
A democracia dá diversos sinais de fraqueza que é necessário assinalar para lhes perscrutar as causas. A crise da democracia está no sentimento, exacto ou errado, da inadequação dos princípios e das instituições da democracia clássica, isto é, parlamentar e liberal, às circunstâncias, aos problemas e às disposições do espírito público.
Reside aí o elemento comum a todos os países, quer se trate dos Estados Unidos ou dos jovens Estados surgidos dos escombros do Império Austro-Húngaro. As situações podem diferir muito, mas por toda a parte prevalece o sentimento de que a democracia já não se encontra adaptada à realidade.
Pode resumir-se a diversidade dos casos a dois tipos distintos. Por um lado, as velhas democracias, isto é, os países onde a democracia é desde há muito a forma de governo, onde está enraizada nos hábitos e nas instituições, onde se tornou também uma tradição. É o caso da Europa ocidental.
Pode resumir-se a diversidade dos casos a dois tiposd distintos (2): Nestes países é precisamente por se ter tornado uma tradição que a democracia sofre. É a sua antiguidade que é censurada. Aparece como caída em desuso, anarquista. Transporta o peso da idade, torna-se sinónimo de um passado desde então definitivamente ultrapassado. O atractivo da novidade joga a favor dos seus inimigos.
Pode resumir-se a diversidade dos casos a dois tiposd distintos (3): Por outro lado, nos países acabados de nascer, na Polónia ressuscitada, na Hungria ou na Jugoslávia, passa-se o inverso: a democracia não pode parecer evidentemente — esmagada pelo seu passado; pelo contrário, parece prematura, pois a opinião pública e a sociedade não estão prontas para a acolher. Trata-se de uma mecânica demasiado complicada, um sistema excessivamente delicado para sociedades politicamente rudes.
Pode resumir-se a diversidade dos casos a dois tipos distintos (4): Assim, simultaneamente, a democracia vê-se reprovada, no Ocidente da Europa, por ser uma sobrevivência anacrónica e, no Leste, por ser uma antecipação não assimilável.